2009 - Santuário dos Pajés em Brasília: espaço de resistênciaPor

18.12.2009 - A cidade de Brasília, cantada em verso e prosa como o espaço de uma das mais importantes obras arquitetônicas nacionais e, também do arrojo e do engenho do presidente Juscelino Kubitschek, tem um passado que muitos querem ver escondido sob o concreto. Aquele lugar, que no ano de 1956 começa a abrigar a nova capital brasileira, era caminho ancestral de diversos povos originários que criaram num ponto específico do território - hoje o Parque Nacional de Brasília - um espaço sagrado. Ali, descansavam e praticavam seus rituais.

No ano de 1958, quando as obras da cidade nova já estavam em pleno vapor e tudo levava a crer que o velho cerrado mudaria para sempre, as gentes das etnias Tapuya, Tuxá, Fulni-ô, Kariri-xocó e Guajajara decidiram ocupar aquele espaço e criar ali o santuário dos pajés, afinal aquele lugar que agora abria passo a um mundo desconhecido já era deles, desde os tempos ancestrais. Premidos pela colonização do início do século XX, os povos foram adentrando as matas, saindo do caminho dos brancos que estabeleciam fazendas e vilas. Muitos foram escravizados e chegaram a abrir com o próprio braço as picadas que levariam as hordas de invasores.

Não foi coisa fácil se manter na terra, bem no meio de Brasília, como se fosse uma chaga viva, sempre sangrando. Mas os povos originários conseguiram garantir que ali se criasse a Reserva do Bananal, lugar de respiro da selva de concreto. Desde 1968 a área está demarcada como lugar sagrado e tem sido preservada e manejada ecológica e espiritualmente pelos indígenas. Ali eles alimentam o espírito e praticam sua mística ancestral.

É da reserva do Bananal, no coração do Brasil, que saem também os gritos de luta da gente originária. Eles denunciam que os Guaranis Kaiwás são perseguidos por fazendeiros em Mato Grosso do Sul, assim como os seus parentes da Raposa Serra do Sol, Ingarikó, Macuxi, Wapixana, Patamona e Taurepang enfrentam garimpeiros, fazendeiros, policiais e militares que usam a lei para justificar o genocídio e a perseguição aos indígenas e a usurpação dos territórios. Dali eles também gritam contra a ação dos policiais que atacam os Sateré-maués em Manaus e denunciam a perseguição que sofrem, ali mesmo, na grande capital.

Agora, banqueiros, empreiteiros e a máquina política de José Roberto Arruda e Paulo Octávio querem especular sobre as terras da reserva. “É terra demais para os índios”, dizem. Mas eles resistem e insistem e permanecer na terra sagrada, cuidando das tradições e da vida. “A máquina do Estado serve a empresas, bancos e partidos para que continuem em nome da lei o negócio de vender a dignidade. Os governos assumem empréstimos com bancos internacionais para alimentar mais ainda a segregação social, fazer cassinos financeiros e especulativos, traficando e desprezando a vida de milhares e a natureza para aquecer o capital e o lucro da ditadura do poder econômico”, diz um manifesto divulgado no Centro de Mídia Independente.

Os indígenas que vivem na Reserva do Bananal insistem em dizer: eles não ocupam a terra, é ela que os ocupa. A relação que eles tem com o espaço geográfico não tem nada a ver com a que tem o branco, com sua propriedade privada, na qual a terra é só uma mercadoria. Então, resistir no Bananal é defender um modo de vida que os brancos até hoje não querem entender.
O pesquisador do IELA, Fernando Correa Prado, esteve na reserva e conversou com uma de suas lideranças, Santxiê Tapuya, que deixou bem claro: o povo tapuya segue vivo porque nunca se amansou. E não vai ser agora!


Nenhum comentário: