Sepé: essa terra tem dono




Sepé Tiaraju é um Guarani que nasceu em data desconhecida, no 1700, na redução de São Luiz Gonzaga, quando ali vicejam as missões jesuíticas. Segundo a história, ele veio ao mundo durante uma epidemia que dizimou quase 30% da comunidade Guarani da região, a chamada “peste indígena” que de indígena não tinha nada. Pelo contrário. Era a escarlatina, uma doença trazida pelos brancos. Seu pai, o cacique Tiarajú teria morrido durante a peste e deixado o menino, com poucos dias de vida, com os padres. Ele também tinha pegado a doença, mas milagrosamente se salvara. Ficou com o corpo cheio de cicatrizes, uma delas bem na testa, em formato de meia-lua, o que ajudou a criar uma mística em torno dele. Dizem que ela brilhava nas noites escuras.

Criado pelos padres ele cresceu em paz, aprendendo tudo o que era possível aprender dos brancos, chegando a ser corregedor da missão de São Miguel. Quando o rei de Espanha Felipe VI decidiu entregar os Sete Povos das Missões para os portugueses, a ordem que chegou para os Guarani era de que evacuassem as  cidades passando para o outro lado do rio Uruguai, sem que fosse levado em conta todo o processo construído ali por anos a fio. Foi quando o guerreiro despertou.

Sepé Tiarajú não aceitou a ordem e decidiu resistir organizando os indígenas para a luta.  Numa carta ao rei ele afirmou: "Nossa riqueza é a nossa liberdade. Esta terra tem dono e não é nem português nem espanhol, mas Guarani". A partir daí foi a guerra e os Guarani enfrentaram os espanhóis durante três longos anos em sangrentos combates.

Sepé tombou num dia sete de fevereiro de 1756, numa batalha às margens da sanga da Bica, um afluente do rio Vacacaí, no município gaúcho de São Gabriel. Com sua morte, perdidos da mais importante liderança, os Guarani acabaram derrotados, sendo mortos às centenas, junto com vários padres, tanto pelos luso-brasileiros como pelos espanhóis.

Com o fim das missões na região que hoje corresponde a fronteira noroeste do Rio Grande do Sul encerra-se também um momento único na vida da América invadida, quando índios e brancos puderam compartilhar a vida. Sepé sobreviveu à morte, virou herói popular e  há quem o considere santo. No ano de 2009 entrou para o panteão dos heróis da Pátria, como herói guarani missioneiro rio-grandense.

Naqueles dias, vencido Sepé, os portugueses comemoraram o fim do povo Guarani. Ledo engano. Os guarani sobreviveram aos massacres e hoje estão de pé, reivindicando seus territórios e o direito de viverem conforme seus costumes. Uma luta sem trégua desde a invasão. Dizem que nos campos sem fim das missões até hoje cavalga um índio, com uma brilhante meia lua na testa, chamando o povo para a batalha.

Gigante e inesquecível, Sepé vive em cada um e cada uma que hoje se levanta em rebelião. Viva Sepé, viva o povo Guarani.  Viva a luta de todos os povos indígenas!

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